TERCEIRIZADOS
Um tema só conversado em baixa voz nas
empresas de “marca”
Muita
discussão sobre a terceirização. E não é de hoje que esse modelo, já como
estava, é um desafio para os comunicadores e para os profissionais de RH.
As
empresas que mantêm terceirizados, não por coincidência, são aquelas que têm o
maior número de empregados. Não por coincidência também, são as que maiores
desafios operacionais enfrentam: segurança, saúde e impactos sócio ambientais.
Os
grandes projetos, na sua operação mais desafiadora e perigosa, contam com as
empresas terceirizadas para sua realização. Nas operações paradas para limpeza
ou revisão estão os terceirizados. Eu trabalhei nos últimos anos para essas
empresas grandes e operacionais. Vivi de perto o desafio dos comunicadores
internos na relação com esse empregado que é e não é da empresa que tem “marca”.
As
áreas administrativas tem também profissionais terceirizados, que se concentram
na tecnologia ou também na comunicação. Mas a grande massa está em Belo Monte,
esteve no Comperj, na Refinaria Abreu e Lima e em todas as obras do PAC.
São
profissionais que transitam pelo continente Brasil. Vão para onde tem oportunidade
de trabalho, deixam viúvas em suas terras natais, criam novas famílias e
favelas para onde vão. É normal que passando 6 meses, um ano numa nova
localidade acabem pensando em ficar por ali, mesmo quando uma obra termina. São
os terceirizados também que cuidam da luz, do gás, do telefone de nossas casas.
O empregado “de marca” é o fiscal. Percebemos com facilidade que esse empregado
é normalmente menos escolarizado, menos preparado para compreender onde está ou
os procedimentos de segurança ou ambientais.
Os empregados terceirizados não têm os
salários, benefícios e os bônus dos empregados de “marca”. Em alguns sites
operacionais comem em restaurantes diferentes. Em algumas empresas carregam o
crachá com o nome da empresa/marca, mas de cor diferente. Em outras circulam
pelos sites, têm funções de grande responsabilidade, mas usam crachá com nome da
empresa terceirizada que na maioria das vezes não é uma “marca”. São empresas
pouco conhecidas, não fazem propaganda na TV, não tem imagem ou reputação para
a sociedade. Cansei de entrevistá-los e de perceber como ficam confusos, dizem
o nome da empresa desconhecida e rapidamente completam, mas eu trabalho na
Vale, na Petrobrás, ou onde quer que estejam servindo a uma “marca”. O sonho do
terceirizado é ser contratado pela empresa de “marca”.
Nos
eventos que acontecem nos escritórios ou sites, os empregados terceirizados,
vivem situações intimidadoras e sempre são uma dificuldade para o comunicador
interno mais consciente. Recebem uma cesta de Natal inferior da suas empresas,
mesmo que sentem ao lado, ou realizem as mesmas tarefas de um colega que
carrega na sua carteira de trabalho uma marca. Não recebem os brindes que
muitas vezes acompanham os eventos internos. No período de bônus, das PLRs PLs,
ou como venham a se chamar, olham distante o benefício ao qual, na maioria das
vezes, não tem acesso. O plano de saúde, o ticket refeição (para os da área
administrativa) são inferiores aos da empresa mãe. Usam uniformes ou crachás
diferentes. Nas empresas de moda, constantemente temos tido denúncias de
terceirizados: bolivianos que trabalham em condições sub-humanas em SP, por
exemplo. Todos os cuidados jurídicos são tomados para prevenir processos na
justiça do trabalho.
Devemos
ter claro que os empregados terceirizados são os que morrem nos acidentes de
trabalho no Brasil. São sempre os que realizam os trabalhos mais difíceis e perigosos.
É um desafio para os gestores: como engajá-los, como controlar o turnover? São
empregados de um projeto, não da empresa. Quando outra empresa ganha a
licitação é normal que sejam levados também. Os terceirizados quase nunca são
ouvidos. Só algumas poucas empresas investem em ouvi-los. Por que se o turnover
é tão alto? Os empregados das terceirizadas muitas vezes não entendem a
empresa, o projeto ou o porquê do trabalho. O personagem Charles Chaplin não
está lá no filme, está aqui e agora. Ele
sabe as metas de produção diária, quantos caminhões tem que carregar, qual sua
tarefa do dia. Quanto à segurança, o procedimento mais frequente é o Diálogo de
Segurança, que na prática não passa de um monólogo do Supervisor que dá ou
reforça procedimentos, regras, sem muito envolvimento. Alguns profissionais de
comunicação interna que esbarrei pela vida percebem a situação e se dedicam em
criar envolvimento com os empregados terceirizados, mas sempre com
dificuldades.
Terceirizado
na operação é o empregado de turno. O empregado que trabalha de noite, dorme de
dia, não vê quase sua família. Muitas
vezes me perguntei: seriam eles os escravos do século XXI? Os cidadãos de segunda classe? Serão uma
excelente solução por que resolvem os custos das operações para as empresas? Assim
estamos gerando mais oportunidades de trabalho? São eles necessários para nossa
economia? Devemos ampliar as possibilidades das empresas terceirizarem? Hum....
Vamos olhar a saúde. Temos muitas
empresas terceirizadas operando a saúde. Estão categorizadas como OS –
Organizações Sociais. Elas têm compromisso com a saúde pública? Mas os médicos concursados
não interessam mais, são caros ao longo do tempo, incluindo benefícios e
aposentadorias. Trocamos qualidade, engajamento e compromisso por custos
menores para os Estados e Prefeituras. Cansei de ver jovens médicos nas
residências de hospitais chorando, em crises existenciais. Eles se perguntam: por
que eu fiz medicina? Médicos jovens e maduros vivem em crise nos hospitais
públicos do país. Ceifar o sonho de jovens médicos que precisam procurar mortos
em leitos hospitalares para transferir seus pacientes não parece um bom
projeto. Escutei os jovens residentes em grandes hospitais no Rio de Janeiro,
como escutei terceirizados de empresas, e eles sim parecem conhecer a verdadeira
situação das instalações da empresa de “marca”. Ser comunicador interno nas
organizações é desafiante.
Vivemos uma aventura monumental, para a
qual eu pergunto: Onde está o humano nos nossos empreendimentos? A quem
pensamos enganar? Como esperar que a ponte não caia, que a corrupção não
exista, que haja compromisso num mundo de negócios que se escondem para ganhar
sempre?
E o que é mesmo ganhar?
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