quinta-feira, 9 de maio de 2013


       Encontro Refletir Brasil com Domenico De Masi – Paraty 2013              
                                                                                                               
OCA REFLETIR BRASIL organizou o encontro em Paraty. OCA é uma consultoria formada por profissionais de renome, que tem a Brasilidade como plataforma para modelos criativos de saber e fazer o novo. Alia conhecimento e prática para dar suporte à inovação e qualidade de vida nas organizações. O encontro foi realizado após a pesquisa Delphi que é uma técnica de pesquisa prospectiva e tem por objetivo propiciar a reflexão individual e coletiva sobre visões de futuro. Seus resultados alicerçam “tomadas de decisões” para realizar o planejamento estratégico de organizações, visando a elaborar ações hoje que estejam alinhadas com as expectativas futuras. No caso da realização da pesquisa para o Refletir Brasil, estudo coordenado, realizado e analisada por Oriana White o objetivo foi entender o significado de BRASILIDADE. Foram entrevistadas 44 personalidades, das mais diferentes áreas de atuação, em três momentos consecutivos: fase exploratória, coletiva e quantitativa, até chegarmos a grandes linhas de resultados, eixos principais que compuseram a formação das mesas no encontro de Paraty. O resultado da pesquisa pode ser conhecido no site www.refletirbrasil.com. Lá também pode ser encontrado o Manifesto resultante do encontro que será a base para construir o evento Refletir Brasil 2014.
Esse é um resumo livre das anotações feitas por Nádia Rebouças do encontro em Paraty do Refletir Brasil. Um momento especial que profissionais de várias áreas puderam se ouvir, sintetizados nos comentários de Domenico, sobre o sonho Brasil!
Além da conversa a cultura esteve presente nesse encontro que terminou com todos cantando cirandas nas ruas de Paraty, homenageando essa cidade que tantas histórias do Brasil se faz presente. Aguardemos o Refletir Brasil 2014!l
               “Nenhum vento é favorável para o marinheiro que não sabe para onde quer ir”.                                                                                                               (Sêneca)
Com uma população de 200 milhões de habitantes, o sétimo PIB do mundo, e a democracia consolidada, o Brasil possui grandes oportunidades pela frente, segundo Domenico de Masi. Tem ainda grandes universidades e empresas admiradas mundialmente, como a Globo e a Embraer, e inexistem guerras no país, diferentemente da China e da Índia. E, com um novo paradigma de comunicação: todos para todos, há um estímulo para que o país se apresente ao mundo. Contudo, parece faltar o elo da responsabilidade. Os cidadãos não se sentem responsáveis pelo país que têm. Não se diz o que quer e ninguém se assume, nem reclama. 90 % da população afirma ainda que a corrupção está no DNA. Todavia, o governo não é o grande pai, e nós somos responsáveis pelo que nos acontece. Como devemos dar o grande passo?
“A utopia está lá no horizonte. Eu me aproximo dois passos, ela se afasta dois passos. Por mais que eu caminhe, jamais alcançarei. Para que serve a utopia? Para isso, para caminhar”. (Galeano)
“Existe um recalque do Brasil- precisamos aprovação do pai europeu. Querem ir para Londres, não para a floresta. Eles legitimam o que falamos e agora é o “pai Domenico”, é o pai que nos manda andar sozinhos. Interessante para o imaginário”. (Fernanda C. Borges)
Ao analisarmos o nosso jeito de ser, percebemos que existe um recalque do Brasil: precisamos da aprovação da mãe Europa que perdemos e não temos o amor do pai, Estados Unidos. E verificamos que temos uma dificuldade de lidar com a mestiçagem. Pois se somos degenerados, somos então europeus degenerados, índios degenerados e negros degenerados. Mas é difícil pensar a partir da mestiçagem. Além disso, existe a corrupção das mentes. O Brasil tem uma cultura diversificada, tem o movimento de evangélicos que assusta muitas vezes, negros, gays, uma enorme diversidade de forma de pensar e viver. As questões da rua distanciam-se da elite. Ou melhor, nossa elite não se identifica com o que acontece na rua.
Cultura é o jeito de viver- lida com homem que não é igual- o mundo é mais preocupado com o Brasil do que nós mesmos. O mundo olha pra gente como povo especial- que pode mudar o mundo- povo que foi achado- e foi construído a partir de muitos. Eles (os colonizadores) não vieram para construir nada. Era espoliar e voltar. Veste a francesa, gosta de comida japonesa, fala à portuguesa. Temos que reagir ao extrativismo corrupto, mal educado que nos forjaram a ser. Quem nós queremos ser e podemos ser? E contribuir para a melhoria do mundo”. (Ronaldo dos Santos)
O brasileiro tem ainda a capacidade de conviver com o diferente e aceita viver bem com a tensão, mas não com a universalização. Pois temos várias cabeças na raiz da nossa identidade, não existe uma tradição a qual nos remeter. Diante da falência das matrizes européia, africana e indígena, o brasileiro elege o inconsciente como objeto de adoração - pois é o que não sabemos.
“Nós diminuímos a distância da senzala na cama. Sexo para negociar conflitos”.
 “Somos um elo relacional”.
“Somos o povo do meio, tenho que me ver com pé de índio, cabeça de europeu” (Ricardo Carvalho referência a da Mata)
“Brasil frente ao espelho- não encontrou nada. Não é ninguém. Um dia foi índio, um dia negro... O que essa mãe Índia tem a nos oferecer?” (Ricardo carvalho)
No que tange nossa diversidade criativa, devemos ser capazes de enxergar as diferenças. Cada grupo pode pensar e fazer a partir de suas especialidades. E já existe uma grande quantidade de pessoas vivendo novos modelos. Em sua maioria, são jovens e invisíveis e não estão no governo, na empresa ou nas universidades, mas estão no coletivo. Quando saímos da linearidade e entramos em uma sociedade em rede, nos damos conta que o tangível é o linear e que os intangíveis são os infinitos. A maneira agora de trabalhar é cooperativa. E devemos mudar a consciência de “um mundo plano para o mundo redondo” (Lala Deheinzelin). Com as novas tecnologias, encontramos uma forma de tornar os intangíveis visíveis. E, ao identificar um tesouro intangível, parte-se para o colaborativo. O Wikipédia é um exemplo bem-sucedido deste trabalho colaborativo, aberto e voltado para o bem comum.
“Criar um ciclo Virtuoso: reconhecimento dos intangíveis. Sair de milênios de tudo organizado no tangível. Se é finito, acaba... modelo de competição- economia da escassez”.  
“Os intangíveis são infinitos na sociedade em rede! A maneira de trabalhar é cooperação. É a Economia da abundância. A diferença do linear e exponencial. (Lala)

A sociedade criativa, todavia, sempre existiu nas áreas carentes. O nome comunidade é oriundo de um compartilhamento de tarefas, que é feito com alegria, como “virar a lage” no fim de semana.
 “O mundo não é, o mundo está sendo”. (Paulo Freire)
O FIB, como alternativa para repensarmos totalmente a economia. Novas medidas, novas formas de produzir, nova moeda. O futuro aponta nessa direção.
“Felicidade é uma habilidade que pode ser aprendida”
Na área da cultura, temos que aprender a nos descongelar. E no Brasil, mais do que em qualquer outro país, deve-se ter a perspectiva da cultura no sincrético – um tipo de fluxo central e descentrado.
“Só a utopia é realista. Tudo que aconteceu veio da utopia”. (Lala)
Para Domenico, não podemos, entretanto, confundir a situação atual com uma situação excepcional. Temos que tomar o cuidado de não transformar o desejo de novidade em neurose. Deve-se ter em mente motivo e objetivo. E nos controlar com os inimigos. Pois quem são aqueles que querem um futuro pior – ou melhor, só para eles?
Como os ricos podem ficar mais pobres! É muito difícil tornar-se pobre. Temos que diminuir 15% da riqueza dos ricos- uma agressividade”. (Domenico)
“O sonho americano está se tornando pesadelo”
Muitos economistas, segundo ele, pensam que a miséria não é possível de ser eliminada. Mas como gerar a riqueza sem fazer minar a felicidade, uma vez que a pobreza são “fomes”?
Na área da educação, temos que dar novo significado à experiência civilizatória sustentável como uma maneira de ser. Pois estamos em uma crise civilizatória e os jovens estão com seu futuro roubado. A sustentabilidade pode ser uma saída. Devemos nos perguntar ainda se é possível a construção social do futuro da comunicação humana. E transformar o planeta em sociedades educadoras. Estamos todos aprendendo a elaborar políticas públicas, com referência na sustentabilidade, e a pensar e agir localmente e globalmente. Há ainda que se redigir um Tratado de Educação Ambiental para a comunidade. E facilitar a inteligência coletiva.
“Escola e fora da escola- romper fronteira- todos nós estamos na escola.
“A educação não transforma o mundo. Transforma as pessoas que transformam o mundo” (Paulo Freire)
No que diz respeito à economia, a versão atualizada dos 10 mandamentos (segundo o economista Ladislau Dowbor pode ser enunciada da seguinte forma:
1-     Não comprarás o Estado;
2-     Não farás contas erradas;
3-     Não reduzirás o pobre à miséria;
4-     Não privarás ninguém do direito de ganhar seu pão;
5-     Não trabalharás mais do que 40 horas;
6-     Não organizarás a vida em função do dinheiro;
7-     Não ganharás dinheiro com o dinheiro dos outros;
8-     Não tributarás as ações positivas da sociedade;
9-     Não privarás o próximo do direito ao conhecimento;
10- Direito à comunicação;
Com relação aos negócios brasileiros e à internacionalização, percebemos a cultura brasileira se inserindo no mundo. Lojas havaianas em Barcelona, vendedores ambulantes pirateando sandálias havaianas, caipirinha no cinema nos filmes de Woody Allen e Almodóvar. O mercado interno descobre o Brasil, e o Brasil aprende a se colocar lá fora. Mas a mídia não percebeu que os tempos são outros. E que não dá mais para controlar seus interesses acima dos interesses da sociedade. “A mídia não está à altura do que estamos vivendo.” Precisamos mudar a nossa marca.
 “O ofício do Brasil só dá certo no Brasil. A gente aceita a máquina- gambiarra vira recurso técnico”.
Nosso modelo- “a arte de se virar”, se adaptar
“Um vendedor na praia do Rio vendo muita movimentação para salvar um afogado imediatamente começa sua venda: Enquanto não chega seu afogado, vão tomando o seu gelado”.

 Domenico afirmou que toda arquitetura era do primeiro mundo até surgir Oscar Niemeyer. Ele foi o primeiro a criar um estilo e obrigou o mundo a admirar esse estilo e até comprar este estilo. E sugere que se faça o mesmo com a cultura. Diz ainda que há necessidades radicais para se mudar o modelo de vida atual: a necessidade de introspecção, de ter tempo para nós, de pensar como ser único; a necessidade de amizade, de interação, de afetividade e de amor. E temos ainda as necessidades induzidas pela publicidade que vem do confronto com os outros, do poder e de outras necessidades doentias.
O fato é que o mundo inteiro está insatisfeito com o modelo capitalista. Todos querem um modelo novo. E se o capitalismo perdeu, o comunismo perdeu também. Pois o comunismo não sabe produzir e o capitalismo sabe produzir, mas não sabe distribuir. E precisamos aprender a distribuir muita coisa. Trata-se de redistribuir riqueza e trabalho. E o saber tem que ser compartilhado com o analfabeto. Temos ainda que redistribuir as oportunidades e distribuir melhor as tutelas. Para Domenico, este ponto é fundamental para o Brasil. Pois a corrupção, a inconsequência e a violência dos cidadãos e das organizações vêm da má distribuição de riqueza e saber.  Outro elemento fundamental deste novo modelo é a luta contra o stress. Deve-se colocar também esforço na elaboração, excluir a criação de dinheiro pelo dinheiro e respeitar o ponto de vista alheio. É necessário ainda organizar as empresas para as pessoas serem as mais felizes possíveis. O trabalho em casa, no bairro, ou na praia, por exemplo, pode melhorar o trânsito. O Rio, em particular, possui alegria e beleza, e a beleza é uma joia, uma alegria criada para sempre.

Nádia Rebouças (comunicação para transformação) com a colaboração de Anelise Pacheco (profissional da área cultural)


Nenhum comentário:

Postar um comentário