quarta-feira, 6 de novembro de 2013

Plurale completou 6 anos e eu me lembrei do texto que escrevi o ano passado. Compartilho.

Comunicação e seu papel estratégico para transformação.

Cinco anos de Plurale! Cinco anos de comprometimento com uma comunicação que dê significado e significância ao que precisamos fazer: transformar nosso mundo.  A comunicação tem uma importância fundamental para nos equipar a fazer diferente, em todos nossos ambientes. Como podemos fazer isso sem ter informação? Sem saber que estamos perigosamente atingindo os limites de nosso planeta?
 Esse mês passado, por duas ocasiões, refleti sobre o tema: A comunicação pode mudar o mundo? A primeira foi com os estudantes de comunicação da UNISC em Santa Cruz do Sul, estado do Rio Grande do Sul.  Escolheram esse tema para a Semana de Comunicação. Voei para lá, porque só a escolha do tema é uma prova de que essa nova geração de comunicadores anda pensando diferente. A outra oportunidade foi no NEF – Núcleo de Estudos do Futuro – da PUC São Paulo. Lá estavam reunidos aqueles que estão comprometidos com o futuro da humanidade. 
Duas oportunidades para refletir sobre nosso papel como comunicador. Em homenagem à Plurale desenvolvo o roteiro dessas conversas. Comecei dividindo com esses públicos, tão diversos, que a comunicação sempre mudou o mundo, desde quando ela era apenas lida, num pergaminho, nas praças dos embriões das cidades medievais, pelos enviados dos poderosos. Mas não fui para tão longe na linha da história, preferi refletir sobre o que vivi, nas décadas em que fui publicitária, vendo o mundo mudar, para o que temos certeza que tem que mudar hoje. A década de 60 começou a trazer as diferenças. Mulheres, negros, homossexuais. Na mini série Gabriela podemos ouvir um homem falar para sua mulher: se arrume que hoje eu vou lhe usar! Ou na novela das 18hs observar a perseguição ao negro recém liberto e que mantêm nosso sutil racismo até hoje.
Comecei a trabalhar em publicidade na década de 70. Do lado da minha casa ainda havia quitanda, açougue e padaria. Nesse comércio girava a economia do bairro. Éramos chamados pelo nome e tínhamos uma caderneta que anotava o que gastávamos. Já tínhamos shoppings, mas iniciantes. Lugares meio estranhos. Nasciam os supermercados e me lembro do meu espanto lendo o primeiro manual da Johnson& Johnson ou Unilever, não me lembro bem, sobre merchandising nos supermercados. Percebi que nada, mas nada mesmo, era feito sem reflexão estratégica para nos tornar consumidores. Começaram a nascer ali os consumidores que conhecemos hoje, que agem como autômatos comprando e comprando.
O Brasil dava primeiros passos para sair da ditadura que infernizou a juventude de minha geração. Para os jovens fica difícil imaginar o tipo de juventude que tivemos, sem internet, mas pior, sem poder comprar livros, assistir determinados filmes e preocupados em cuidar dos encontros com amigos porque podiam ser interpretados como subversivos.  O governo militar fazia sua primeira estratégia de comunicação, apelando para nosso orgulho de ser brasileiro, inventando um milagre econômico e convocando: Pra frente Brasil! Ame-o ou deixe-o. O Brasil ganhou pela terceira vez a Copa do Mundo confirmando nossos milagres econômicos. Os porões da ditadura tinham minutos de paz nas torturas, para comemorar os gols desse Brasil grande!
 A indústria se expandia, a publicidade se profissionalizava com metodologias e processos trazido pelas multinacionais. Aprendia-se a fazer planejamento de comunicação, muita pesquisa e a medir, pela primeira vez, a audiência dos programas de televisão – o GRI. Tudo voltado para criarmos um mercado de consumo interno, uma classe média. Os publicitários, odiando a censura que invadia os meios de comunicação, lançaram o CONAR. Liberdade à publicidade! Muitos mercados a construir! Mercado para os descartáveis, tipo Perfex que as brasileiras não entendiam: se camisas velhas e pedaços de toalha conseguem ser tão úteis, para que comprar um paninho furadinho? Mas o mundo “do jogar fora” começou sua trajetória, mudando nossos hábitos. Fui para Brasília, com meu chefe, pedir autorização para veicular o primeiro comercial de Modess, só existia ele no Brasil. Autorizaram a veiculação, contanto que a moça usasse calça comprida vermelha. Nunca entendi porque não podia ser branca, mas a censura sempre tinha razões que a razão desconhecia.
 Modernização da agricultura.  Supermercados. Shopping Centers.  Marketing. Consumo e crescimento da economia.  A grande massa subiu um degrau na escala e uma minoria subiu vários degraus. O nordeste já era seco e cheio de fome! Formou-se uma classe média com possibilidades de financiar educação para seus filhos e gerar demanda significativa de produtos e serviços. Veio a anistia, depois de muito terror, e a abertura lenta e gradual. Assim chegamos aos anos 80 que revelaram a grande farsa. O milagre virou pesadelo e os Danones e gelatinas prontas estragavam nas gôndolas do supermercado.  Os dados Nielsen da época anunciavam queda no consumo de macarrão! Acentuou-se a corrupção. Sindicatos se organizaram em greves e manifestações.  A economia não conseguiu apresentar índices de crescimento. A classe média foi à principal vítima. Perdeu o poder de compra. Tirou o filho da escola particular e não sonhou mais com o segundo carro. Só muito mais recentemente o IPI reduzido multiplicou o sonho do carro.
A propaganda e o marketing viveram anos de muita agitação oscilando entre grande pessimismo e euforia intensa.  A figura da mulher ganhava força nos anúncios e muitas vezes com apelos eróticos, como símbolo do feminismo, foram mudando os padrões de comportamento social. Tudo isso fica mais evidente olhando os anúncios da época. Você pode entrar no Google e fazer esse exercício de reflexão pelas décadas. Vai sentir que foi com a comunicação que se mudou o mundo. As empresas desenvolvem produtos e serviços, mas é a comunicação, no seu mais amplo aproveitamento, que cria mercados. Essa década foi chamada por alguns de década perdida, mas na prática ela lançou as bases da sociedade de consumo que somos hoje. Trouxe os novos comportamentos sociais também e até a gravidez na adolescência.
A década de 90 chega com esperanças. A ditadura estava longe e podíamos imaginar um novo mundo. Cai o muro de Berlim. Foi a primeira vez depois de 47 anos que os brasileiros puderam votar num presidente. Elegemos Collor e nos unimos para tirá-lo do poder. Aconteceu a ECO 92, Conferência mundial do meio-ambiente no Rio de Janeiro. Começou aí tudo que se desdobrou em comportamentos de compra diferentes: o natural, menos carne, a roupa indiana virando moda para elite, o começo da consciência de maior número de pessoas de que o planeta poderia ter limite. As ONGs alemãs traziam o conceito dos “verdes”. Palavras novas surgiram como ecossistema, biodiversidade.
O sociólogo Betinho mobilizou toda a nação com a sua “Ação da Cidadania contra a miséria e pela vida”. Havia fome no Brasil, não adiantava a elite fingir não enxergar. Como crescer o país com tanta desigualdade?
Maior consciência ecológica foi o ganho da década. Cresceu o trabalho de ONGS para proteção do meio-ambiente, reciclagem de materiais, além da preocupação com a exclusão. Surge uma segunda geração de ONGs no Brasil e aos poucos o conceito de empresas cidadãs.  A comunicação foi mudando consciências. A sociedade foi ficando mais tolerante para opções de conduta pessoal, prática de sexo, namoro e casamentos. Vida cultural se ampliou, os filmes e livros chegavam. A abertura de mercado, do livre trânsito de idéias e produtos culturais e começou a estonteante rapidez dos meios de comunicação.
A chegada dos anos 2000 era uma esperança, uma nova era. Nos negócios a nova era tinha muita pressa. Muitas demissões, privatizações já haviam acontecido na última metade dos anos 90. O Computador nos invadiu para bem e para o mal. Gestão ganhou força nas empresas e responsabilidade social virou obrigação, bem como mais tarde chegou a hora de incorporar sustentabilidade. Todas as novidades, que ganham força no tecido social, passam a ser incorporadas pelo sistema de mercado e de alguma forma tem seu “significado” controlado. Na prática só dá para entender isso quando entendemos de “marketing” e comunicação é claro! É ela que fala das essências das marcas, que cria a necessidade de consumir determinados produtos, que nos lidera para a ditadura do TER.
Mas a civilização não pára e forças atuam em conflito no tecido de alta complexidade da civilização atual. A globalização, a percepção do triple botton line, o conceito de stakeholders, começam a entrar nas grandes organizações. A internet, outra vez a comunicação, obriga os governos e as corporações a refletir e mudar as estratégias de ação. Comunicação do século XXL? Está tudo em transformação. É a época “do sem tempo”, tudo é fast. Para as mulheres a época do “corra Lola, corra”. Ninguém sabe muito bem porque corremos tanto! Queremos crescer, o máximo e o mais rápido possível. Mas nas rádios corredor e nos consultórios dos psicólogos todo mundo chora uma vida perdida, mesmo aqueles que não viveram outras épocas. Com a globalização os mercados continuam a crescer, mas a que preço? Crescem menos, nesse tão falado 2012. Quem se uniu, quer se separar. A falta da visão sistêmica leva cada país defender o seu. As grandes corporações, que não tem território, estão correndo por fora, construindo uma rede de controle global.  Crise econômica? Crise ética? De percepção?
A consciência de uma mobilização global pela vida cresce em número de adeptos, mas a transformação é lenta. Novas mídias se apresentam e o mercado de comunicação enfrenta muitos desafios para se adaptar.  As redes sociais obrigam as empresas a levá-las em conta! Mudança de paradigmas. Multidisciplinaridade, diversidade e pouca previsibilidade do futuro. As economias locais, que foram desaparecendo desde a década de 70, fazem todos nós consumidores do mundo. Mas surgem moedas locais e o interesse para mudar a fórmula do PIB. 2012 nos mostra que tudo é “líquido”. (conceito de Zigmun Baumam).
A consciência que estamos afetando de maneira irreversível nosso planeta, que precisamos modificar nossos modelos de gestão e nossos padrões de consumo, de produtos e serviços, se apresenta como uma questão vital para o futuro.  Também como nos diz Baumam: HIPOTECAMOS NOSSO FUTURO. O limite de nossa arrogância está no limite da terra. “A principal pergunta hoje não é o que fazer, mas quem vai fazer!” (Zygmunt Bauman)
 Não pode existir empresa bem sucedida e sustentável numa civilização que mantêm parte da sociedade na “idade média” e onde não existe o “palco”, a terra para atuar.  Uma empresa só é dona da sua imagem, mas perdeu o controle de sua reputação! Como nos fala Manuels Castells: a mistura da ocupação das praças com as redes sociais é nova, não sabemos o que vai gerar, mas assistimos a essas mudanças. A juventude está diferente das duas décadas anteriores.
Visão sistêmica começa a mudar crenças, estilo de vida, valores. Poderemos escolher? Podemos mudar?  A diversidade é um fato, os refugiados e emigrantes, que estão por toda parte, nos mostram nossa dificuldade de convivência e conversa com o diferente. O que fazer com a noção de estado, nação e território num mundo de corporações transversais? O que fazer num mundo que incorpora o conceito de sustentabilidade, sem percebê-lo sistêmico e que continua falando em crescer, crescer com o maior lucro possível para os acionistas? Será que a economia não tem que se transformar perguntando por que existe? Não seria adequado pensarmos que ela existe para fazer fluir a felicidade das pessoas e cuidar do meio ambiente? Imaginemos uma utopia: todos os economistas acordariam encontrando um novo sentido para seu trabalho: cuidar das pessoas e do planeta. Daríamos uma virada na espiral do desenvolvimento humano.
Voltemos à pergunta? A comunicação pode mudar o mundo? Pode, porque sempre mudou. O desafio agora é se queremos usar a comunicação para mudar o mundo ou para manter nosso desatino. Se vamos ter novas tecnologias para nos salvar, mas especialmente novas lideranças nos governos, nas empresas, na academia, nas comunidades que possam estar criando o novo mundo para que nós profissionais de comunicação possamos anunciar, vender! Enquanto esses novos produtos e serviços de uma sociedade que escolhe só SER não chegam, vamos apostar na vanguarda que sai protegendo árvores, animais, seres humanos excluídos, que faz feira de desapego, que troca presentes, que não quer propaganda para nossas crianças, que medita que anda de bicicleta, recicla seu lixo e planta uma hortinha ou ocupa praças, ou seja, aqueles que são capazes de sonhar. As mudanças sempre começaram pela mão de alguns, não é Plurale?

Vamos investir na educomunicação, diálogo e empatia certos de que, ao longo da história, não somos tão diferentes assim. Buscamos o atendimento às nossas necessidades básicas, carinho, respeito, liberdade e paz. 

terça-feira, 5 de novembro de 2013

A arte da conversa
                

“Vivemos numa época sem precedentes: todas as culturas mundiais, do passado e do presente, estão de certa forma ao nosso alcance, seja na forma de registros históricos ou como entidades vivas. Na história do planeta Terra, isso nunca aconteceu”.
Ken Wilber
 
Todos nós estamos envolvidos com um dia a dia tão dinâmico que nos acostumamos a não ter espaço para pensar. Quem dirá para conversar! Nossas tarefas se multiplicam de forma acentuada, fazemos duas ou três atividades ao mesmo tempo. Ser multitarefa não é mais um diferencial, mas uma necessidade básica. Vivemos procurando tomadas para ligar nossas extensões: o notebook, o celular, entre outros. Quem sabe, lá no fundo, não gostaríamos de recarregar nossos cérebros em uma dessas extensões? Ou nossos corações? Muitos já estão querendo aplicativos para tentar entender o ano de 2013. 
 
Além da correria, a instabilidade e a incerteza fazem parte do cenário atual. Ken Wilber pede nossa atenção para o fato de que pela primeira vez na civilização temos acesso a toda história da humanidade ao alcance de nossos dedos. São fatos históricos, fotos, imagens, símbolos que fizeram parte da longa estrada da civilização que nos trouxe até aqui. Também, muito diferente das gerações anteriores, podemos conhecer todo o planeta, todas as culturas, hábitos e formas de vida. Conseguimos tornar o mundo pequeno e acessível, mas, ao mesmo tempo, nos sufocamos de informações. Acentuamos na pós-modernidade nossas impressões da diversidade e pluralidade que, à primeira vista, poderia significar que aprendemos a conversar melhor.
 
Mas não foi isso que aconteceu, por uma característica narcísica que tomou conta de nossa sociedade. Consideramos ‘civilizado’ aquele que tem o direito de se expressar democraticamente, mas, o “meu grupo”, evidentemente, carrega a verdade e é o que expressa o melhor ponto de vista, quando comparado aos outros. Assim, por exemplo, temos grupos que, na defesa de seus pontos de vista, perdem completamente a visão do todo. Temos antropólogos, psicólogos e sociólogos competindo, cada um acreditando que tem a maior capacidade para definir e entender o ser humano. Como se não fossemos uma fantástica mistura de tudo.
 
Isso nos mostra que temos muita dificuldade em adotar a visão sistêmica. Empresas privadas, governos e ONGs conversam, por exemplo? As empresas subiram seus muros para não enxergar sua vizinhança durante décadas. A maioria ainda intitula as comunidades como “seu entorno”, reforçando a arrogância e impedindo qualquer avanço em direção a uma sociedade mais igualitária. O meio ambiente ou a natureza estão “lá fora” e não nos incluímos. As grandes obras são planejadas por engenheiros e quando começa a construção se descobre profundos problemas ambientais e sociais. O trabalho em equipe, compreendendo os novos desafios, teria certamente outros resultados. Nem é preciso falar nos muros que as empresas subiram internamente, físicos ou não, isolando seus próprios departamentos em ‘feudos’. Quantas vezes vimos departamentos, que fazem parte de uma mesma empresa se posicionarem como numa concorrência, como se fizessem parte de empresas separadas? 
 
Sofremos de uma doença grave: a “síndrome dos donos da verdade”. Essa doença é percebida por dois sintomas. O primeiro, um forte sentimento de vítima, a culpa é sempre de um elemento externo ao “nós”. O segundo, a falta absoluta de empatia frente ao diferente, apesar de defendermos que é isso mesmo que devemos sentir. Essa doença também afeta nosso ‘walk the talk’, órgão da credibilidade, que nos torna, muitas vezes, os “conversadores” de novos tempos, enquanto insistimos em nossos órgãos de defesa do ego que nos levam a ‘walk’ em total desarmonia com o ‘talk’.
 
Para exercer “nosso pluralismo”, tentando promover a integração e a troca, marcamos muitas reuniões, conference calls, vídeo conferências, mesmo que nada, de verdade, na maioria das vezes, seja resolvido. Dentro das organizações, os departamentos, áreas e localidades tentam se encontrar e trocar, mas a verdadeira conversa raramente acontece. Nas reuniões escuto muitas vezes uma conversa que está oculta, nos gestos e olhares. Nossa conversa é determinada pelo medo, pela defesa e pela ansiedade. Em nossa cultura, não são muito frequentes as oportunidades de falar com liberdade e sinceridade. E, menos ainda, ter empatia ao ouvir o outro. Quem conversa são os nossos “papéis”. As nossas “pessoas” inteiras que carregam “quereres”, “sentires” e “pensares” ficam penduradas num cabide, na entrada da porta das salas de reunião. Somente na saída, quando recuperamos nossas “pessoas”, voltamos a ser um pouco mais inteiros e, por isso, a conversa é sempre tão intensa nas rádios-corredores. Você já percebeu dentro da sua empresa uma pessoa que parecia um corpo que não tinha “gente” dentro? 
 
E o ‘gerente cara de porta’, você conhece algum? Nossas lideranças se habituaram a um novo mantra, já que foram convocadas e exigidas a serem gestores de pessoas. Aflitos com as novas exigências, sem jamais terem sido preparados para isso, costumam repetir: “minha porta está sempre aberta!”. Esquecem-se, no entanto, que eles têm uma “cara de porta”, essa sim muito mais eficiente para manter seus liderados à distância. As pesquisas de clima identificam como conversamos mal dentro de nossas organizações. Nas pesquisas OFFPLAN, metodologia que criamos na Rebouças & Associados, percebemos que a verdadeira comunicação interna fica por conta da rádio-corredor ou rádio-peão, da área do café, do elevador e até dos banheiros. Essa rádio, que não tem botão, controle remoto ou caixa de som, comunica gerando muito ruído, já que a ‘pauta da programação’ é resultado da falta de informação verdadeira. Sofre o líder, porque não sabe como conversar sobre os temas “delicados” (como remuneração, cortes, feedbacks, acidentes ambientais) com seus empregados. E estes são exatamente os temas que despertam maiores dúvidas e perguntas. Sofremos todos. Vivemos sempre entre o imaginário e o real. E enquanto isso, a comunicação corporativa produz veículos que nos mostram muitas fotos, muitas cores e sempre sorrisos misturados a textos com tom de propaganda ou meras informações. Por sua vez, as publicidades institucionais ou mesmo as de varejo, nos mostram um mundo de sonho. Decididamente, os empregados e os stakeholders da marca estão vivendo uma experiência muito distinta do que a comunicação traduz. Nas pesquisas que conduzimos em empresas, pedimos que os empregados: Como percebem a conversa nas organizações em que trabalham? Essa é uma forma simbólica de tentar avaliar como são, de fato, os relacionamentos nas organizações. Colecionamos desenhos que retratam computadores na boca, muros que separam departamentos, organizações simbolizadas por monstros de três cabeças. São frequentes também desenhos de ilhas, cada uma representando um departamento. No meio do rio onde elas estão inseridas surgem jacarés e são eles que darão cabo do empregado que tentar sair da “normalidade”. É a morte anunciada dos protagonistas: 
 
- “Aqui é assim...”
- “Você anda tão animado! É que você chegou agora, fale comigo daqui a dois meses!”
- “Você não conhece essa companhia, isso não dá certo aqui”. 
 
Assim criam-se os mantras que matam os jovens empregados, aqueles que poderiam trazer oxigênio para a empresa e que não gostam do papel de vítima. Temos de fato uma crise geracional nas empresas. Matamos os protagonistas diariamente procurando repetir os mantras: “não adianta”, “não vai mudar”, “não tem jeito”. Também notamos em nossas pesquisas que o “empregado-vítima” adora novas regras. A partir delas, ele terá mais oportunidades para reclamar, reforçando sua percepção de que não vai dar certo, de que tudo continuará como está. E em questão de minutos, essa será a conversa da rádio-corredor. Já o empregado-protagonista, aquele que acredita no poder que tem para transformar a ele, a empresa, a sociedade prefere saber qual é a missão e quais são os valores da organização para que sirvam como uma bússola norteadora do seu caminho. Cada vez mais colaboradores se certificam de que podem se identificar com os valores da empresa onde trabalha, e muitos estão se tornando empreendedores, vão para os hubs, vão investir no seu empreendedorismo.
 
Comunicação como educação
 
Esta falta de conversa vem, pouco a pouco, se transformando. As empresas começaram, de fato, a se preocupar com os relacionamentos interpessoais, a pensar a comunicação como educação e, como tal, adquirir importância estratégica para as organizações. Ainda falta coragem. Não basta informar. O velho modo de definir comunicação como emissor e receptor não explica a comunicação que o mundo atual exige. Pense redondo, pense em espiral. A verdadeira comunicação é semelhante a uma espiral. Conversar é ir e vir na troca incessante dos pensares e sentires dos interlocutores. Um líder que se capacita para a verdadeira comunicação aprende e ensina todo o tempo. Quando todos se tornarem aprendizes desses novos tempos, talvez seja possível criar ambientes mais harmônicos e humanos nas nossas organizações e, portanto, na nossa sociedade. Da mesma forma, deve ser a conversa com as comunidades das quais fazemos parte. A conversa bem posicionada e franca é a única que pode construir relações verdadeiras, que nos ajudam, nos fortalecem e nos capacitam a lidar com as infindáveis transformações que vivemos. Essa situação poderá mudar de modo significativo quando conseguirmos transformar nossas conversas em trocas de intenções ao invés de continuar a fazer delas um meio de ocultá-las. Esse, certamente é o maior desafio para as lideranças das organizações. Não vejo resultados em fingir, em tentar controlar para que não haja conflito. O verdadeiro diálogo se dá no silêncio das reuniões. Precisamos amadurecer e investir na transformação de consciências para que a civilização avance. A espiral do desenvolvimento humano precisa avançar e líderes conscientes da importância da comunicação podem efetivamente ajudar na percepção de que todos os estágios dessa espiral são importantes.
 
Nas empresas é preciso construir o dialogar. Falar a verdade, enfrentar a verdade, dar feedbacks, abrir a porta. Precisamos aprender a ter uma conversa consciente, uma conversa viva, sem segundas intenções que apostam na morte do interlocutor. Precisamos aprender a ouvir. Aprender a perguntar. Aprender a sentir o outro, com a história e trajetória do outro. Colocar-se no lugar daquele que queremos que aja como decidimos que deve ser. A pergunta abre portas nas nossas mentes, acorda novas percepções. Perguntar e ouvir as respostas. Nos nossos veículos de mídia interna, raramente conversamos com os colaboradores. Simplesmente informamos. E informar não é comunicar. A informação é instrumento de controle, de poder. “Viu? Eu informei. A empresa informou”. No entanto, nada mudou, porque a informação não chegou, não transformou, não educou. Ela virou paisagem. Não houve comunicação. Não houve troca. Não houve conversa. Nosso hábito é fazer perguntas padronizadas, às quais, por sua vez, suscitam respostas estereotipadas. Ou seja, dizemos o que os outros querem ouvir para que eles nos respondam o que queremos escutar. Assim, nada se aprende e nada se ensina. Em geral, julgamos que uma questão bem formulada é aquela que põe o outro em dificuldades. Com muita frequência, usamos a conversa para “vencer”. Manda quem pode, obedece quem tem juízo. Saber perguntar é pretender aprender algo, abrir novas possibilidades. Antes de se ter a pretensão de receber algo de quem se pergunta, equivale dar-lhe uma oportunidade para a transformação por meio do diálogo. Aprendemos a debater e discutir, desde a tenra idade.
 
Nossos spots na mídia também começam a deixar para trás as ordens imperativas, as notícias para ganhar o tom da conversa. São mais longos, têm uma temática que se repete, frequentemente apelam para perguntas como forma de chamar atenção e abrir uma conversa com o consumidor, que virou um interlocutor.
 
Há uma década era possível usar um comercial de 30 segundos por três anos, mas hoje isso é impossível. Precisamos inovar a todo tempo. Também é impossível esconder fatos que acontecem dentro das empresas, isso se tornou um desafio no mundo da internet e do celular com câmera. Que dirá dos jornais que tanta crise de credibilidade vem enfrentando. E o grande desafio ainda é aprender a conversar com os outros setores da sociedade (governo, comunidade, imprensa, ONGs), o que pode representar um começo de novas soluções sistêmicas para os nossos velhos desafios do desenvolvimento sustentável. Conversar com o outro significa que o mundo está conversando consigo próprio por nosso intermédio. É por isso que conversar significa estar com, encontrar-se, religar-se, descondicionar-se, libertar-se. Logo, a multiplicação dessas conexões e sua organização, em forma de rede, constituem o ponto central de qualquer processo importante de transformação.
 
As organizações, para muitos autores, é uma rede de conversas. É nessa rede que encontramos as forças e fraquezas de uma organização. É nessa rede de conversas que a empresa encontra o melhor aproveitamento de sua potência, chegando aos resultados desejados. A conversa constitui uma oportunidade para que as emoções de cada interlocutor se reorganizem. Ela promove o entrelaçamento do emocional com o racional. A liderança e os profissionais de comunicação e RH, em especial, podem e devem ser os agentes da conversa na organização. As reuniões e os workshops precisam representar espaços de liberdade individual e, em consequência, oferecer oportunidades para aprender a conversar e a produzir em grupo. É hora de decretarmos o fim das vítimas e estimularmos o protagonismo na construção do futuro das organizações, estimulando o pensamento sistêmico. Isso só será possível se cada empregado entender a essência da sua organização, se identificar e introjetar seus valores e não apenas saber enumerá-los.
 
A diferença está na atitude. É urgente abandonar o egocentrismo e o etnocentrismo que invadem áreas e departamentos da empresa para sermos contaminados com o globocentrismo. Afinal, hoje já temos empresas multinacionais e teremos muitas mais. É hora de fazer diferente.
 
Como uma empresa pode ser nacional ou global se não sabe conversar e somar diversidades para que elas se multipliquem em eficiências? A diversidade de opiniões, que caracteriza os grupos dentro das organizações, deve ser um espaço de criação, que jamais se fecha e nem tem limite de preenchimento. Educar-se é também adquirir a capacidade de identificar e ampliar ainda mais os espaços de conversação. A verdadeira conversa é indispensável para a saúde de qualquer organização. Inclusive para as organizações do terceiro setor, cidades, comunidades. Saber conversar é saber ser livre. Saber promover conversas, estimular lideranças, promover a consciência e o protagonismo é ser hoje um profissional de comunicação. E como dizia Jung: “mas e se eu descobrir que o inimigo está dentro de mim mesmo, que eu sou o inimigo que deve ser amado, e aí?”
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Sugestão de Autores e algumas obras 
Marylin Feguson – Conspiração Aquariana
Joseph Campbell – Mito do Herói
Fritjoff Capra – O Tao da Fisica
Robert Fisher – O Cavaleiro Preso Na Sua Armadura
Ken Wilber – Modelo Integral, Teoria de tudo.
David Bohm – Diálogos, rede de convivência.
Fred Koffman – Metamanagement
Otto Scharmer – Presença
Chris Aryris – Modelo mental 2
David Cooperrider – Diálogos Apreciativos
Joseph Jaworsky – Sincronicidade
Rafael Echeverris, Humberto Maturana, Fernando Flores – Linguagem
 O princípio da Totalidade - Anna Lemkow