sexta-feira, 3 de abril de 2015

Preconceito




O que me inspira a falar hoje é a clara percepção de como é fácil deixar nossos pré conceitos a mostra. Como emergem com facilidade, evidenciando nossa história, nossas experiências, nossa identidade. Não necessariamente temos controle sobre isso, nossas heranças nos tapeiam e emergem. Elas ficaram em evidentes nesse momento do Brasil. Desse Brasil que nos acostumamos a pensar democrático, depois de tanto sofrimento com a ditadura, um grande continente unido pela mesma língua, pelas belezas naturais, pela música, artes num diverso território, do qual todos fazemos parte, apesar de nossas partes tão desiguais.

De repente, pobres e ricos viraram Nordeste e Sudeste se perceberam debaixo dos lençóis. Como se os do Sudeste não dançassem as músicas produzidas no Nordeste ou não se deliciassem com os resorts à beira de praias de águas uterinas de lá. Como se o sudeste de repente não se percebe produto do nordeste emigrante e protagonista que ajudou a construir a maior cidade do Brasil. Triste mergulhar em nossa consciência, perceber nossas heranças. Triste assistir a nossa baixa capacitação para o exercício da democracia. Já temos o grave problema do racismo entre outros que não nos dão nenhum destaque para a contemporaneidade. Onde guardamos tantos preconceitos? Não guardamos...eles, sutilmente estão soltos por aí, produzindo mortes, impedindo a paz e a justiça.

Não, não quero falar de eleições. Já foram muito faladas. Elas apenas são uma desculpa pra eu falar de comunicação interna nas nossas organizações. Se temos tantos preconceitos é razoável imaginarmos que ele não está presente na administração de nossas empresas? É razoável imaginar que os diretores fiquem distantes, sem conexão, com seus operários, ou mesmo de seus empregados administrativos da baixa hierarquia? Que possamos olhar nossos copeiras nos escritórios ou nossas empregadas domésticas como “diferentes”? É razoável imaginar que a frase que mais escuto nas pesquisas de offplan “manda quem pode, obedece quem tem juízo”, não é um alerta dos tempos outros, da era pré tecnologia, onde o conhecimento ficava guardado?  Não estaríamos hoje vivendo um embate geracional, um embate entre os nascidos os nativos na tecnologia e os adaptados? Não haveria hoje, nas nossas empresas e na sociedade, uma ameaça a velha estrutura hierárquica, a nossa cultura de obediência frente ao convite à autonomia que os avanços tecnológicos nos oferecem?

Não tem mais “obedece”. Não tem mais “fico calado”. Entramos num tempo novo, o operário de turno tem faculdade, um soldador ganha mais dinheiro que muito graduado, os filhos das empregadas domésticas vão para as universidades e a confusão se estabelece. A parte que não conquistou nunca o poder escapou do “seu lugar.” E agora onde mesmo enxergo o meu lugar? A liderança seja econômica ou social intui, sentem que as coisas saíram do lugar. Nossa liderança precisa mudar?

 Carecemos de lideranças. A gestão do país e das empresas se encontra em crise. Velhos modelos de administração falham. A comunicação interna em qualquer organização, especialmente a direta, está em crise no Brasil. Normal pensar que ela desponte, já que está há anos na base da crise das empresas, das cidades, dos países.

Estamos sendo desafiados a olhar nossos pré-conceitos. Quando ouço a nova e velha Presidente do Brasil dizendo que a principal palavra do momento é diálogo, tenho vontade de convidá-la para o curso Experiência da Conversa. Não terá espaço à frente para aqueles que não se prepararem para o diálogo. Não adiantarão os pré-conceitos, o mundo está a nos exigir novos conceitos.

E por falar nisso, alguém ouviu algum dos dois candidatos do 2º turno falar em sustentabilidade? Falar em desenvolvimento humano? Ou ainda demonstrar por sua atitude algum novo paradigma? Seja social, ambiental ou econômico? Não. Ouvimos do mesmo, quando nada mais é o mesmo. Temos difíceis tempos pela frente.

Nesse fim de ano só posso desejar feliz lúcido tempo para uma nova comunicação! Feliz tempo para tomar consciência de nossos pré-conceitos, que só levam, a cada parte, a se achar dono da verdade. Má notícia. Não existem mais partes. Não existe mais verdade. Existe um  todo, que não enxergamos e muito, muito complexo!

Que possamos dar pequenos passos em direção ao sistêmico. Que possamos perceber que o conforto pode estar na mudança. Fico aqui cuidando dos meus pré-conceitos, muitas vezes com vergonha de como facilmente ele se manifesta, e torcendo para que esse seja mais um pedacinho do ponto de mutação.

 Texto publicado em março no site da ABERJE.

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