terça-feira, 15 de março de 2011

Diálogo, ferramenta para enfrentar a complexidade?

“Aproveitando a etimologia latina da palavra, que significa dar voltas juntos, chamo de conversar este entrelaçamento do falar e do emocionar que acontece no viver humano dentro da linguagem. Sustento, ainda, que todo fazer humano ocorre na fala e que todas as atividades humanas se dão como sistemas distintos de conversação. Por isso também sustento, que em sentido estrito, as culturas – como formas do conviver humano, naquilo que o faz humano, que é o entrelaçamento do falar e do emocionar – são redes de conversação. E também por isso afirmo que as diferentes culturas, enquanto modos diferentes de convivência humana são redes diferentes de conversação. E uma cultura se transforma em outra quando muda a rede de conversações que a constitui e a define”.
Maturana

Vocês já notaram a quantidade de metodologias de Diálogos que têm surgido nos últimos anos? Há uma corrida para contemplar a diversidade, para ampliar a capacidade de conversa, seja dentro das empresas, nas suas áreas de impacto ou nas cidades. É impossível seguirmos sem nos capacitarmos para conversar, para abandonarmos a antiga idéia de que alguém é dono da verdade, ou ainda, que só ele pode oferecer soluções para outros grupos sociais, porque é ESPECIAL.

É hora de pararmos de falar em sustentabilidade e começar a atuar. É hora de deixar a maquiagem para lá e enfrentar com profundidade o desafio de construir um mundo que caiba no planeta. Será que não é esse o recado das grandes catástrofes que estamos assistindo nesse ano? Caberia numa ilha estreita centrais de energia nuclear, quando tanto nos falam os cientistas do aquecimento global? Foi um terremoto, mas outras notícias apontam para os absurdos que fizemos. Será que estamos surdos aos que nos alertam há três décadas?

Sabemos discutir, debater, falar e falar, mas, quase nunca conseguimos escutar o outro. Mais difícil ainda é nos colocarmos no lugar do OUTRO! Essa situação impacta as empresas e seus departamentos, que encontram dificuldades para fazer trabalhos em conjunto e se perdem na defesa de suas áreas.

Temos o assunto “novo mundo” em várias caixinhas: sustentabilidade, meio ambiente, responsabilidade social, RH, comunicação e nada conversa ou se complementa. É difícil perceber que as áreas estão em conexão no palco da vida e que as empresas ainda não conseguiram criar modelos de gestão que integrem a diversidade, dentro delas mesmas. O pensamento sistêmico ainda é um desafio. Esse é o nó para caminharmos para a sustentabilidade: pensar no todo.


E como enfrentamos nossos problemas econômicos, sociais, ambientais? Todo o dia vejo situações que me fazem perguntar como as empresas, as cidades, os governos podem escrever e falar em desenvolvimento sustentável se não conseguem melhorar a conversa dentro de seus espaços interiores. Como os projetos não pensam na comunicação? Só através da comunicação, como forma de educação e cultura, poderemos mudar os níveis de consciência dos indivíduos. Insisto no ponto de que só um indivíduo consciente pode fazer a diferença num grupo e ser agente de transformação. Mudar seus valores, o que quer comprar, o que quer que seja produzido etc. A maioria das pessoas não consegue fazer nada diferente da rotina introjetada, não tem consciência de onde estamos e do que fazemos e quais serão os resultados de nossos próprios atos.

Cada vez fica mais clara a profundidade da mudança que a civilização tem que operar. Não adianta falar em sustentabilidade. Temos que aprender a pensar e agir para a sustentabilidade. Para isso o desafio é o diálogo. Por exemplo, o diálogo com órgãos governamentais, vários ambientais, comunidades diversas, fornecedores de diferentes portes, parceiros, concorrentes etc. A conversa flui? Existe a disposição para encontrar novas e surpreendentes soluções? As populações nas áreas de interferência sofrem e a natureza, que aparentemente não fala, grita.

Temos várias metodologias para o Diálogo. Os Diálogos Apreciativos, de David Cooperrider (que se desdobrou no World Café), o fantástico livro ‘Diálogos, Redes de Convivência’, de David Bohm que, se lido com carinho, é capaz de produzir inúmeros insights; os trabalhos de Maturana. A ‘Teoria U’, desenvolvida por Otto Scharmer, que propõe a descoberta de novas soluções através de ampla conversa a respeito de qualquer tema, reunindo diferentes lideranças, de múltiplas áreas.

Precisamos começar a treinar e conseguir criar esses espaços de Diálogo.

Espaços de Diálogos até que andam surgindo. Porém, se desenvolvem lentamente por causa da nossa baixa capacitação para a conversa. Acredito que essa falta de talento para a conversa tem dificultado o caminho para o desenvolvimento sustentável. As novas soluções para nossos velhos problemas só vão emergir quando conseguirmos conversar envolvendo atores dos vários setores, sem diferenças de classe, região, cor, gênero, religião, etc. Cada um de nós tem que começar a fazer isso no seu espaço de trabalho. Saia da rotina. Torne seu trabalho um novo trabalho. Tenha prazer com o que você faz, descubra o benefício do seu fazer. Converse. Não levante todo dia para nada ou para o mesmo. Isso é muito chato!

Na Rebouças, temos tido oportunidades para perceber a diferença que o Diálogo faz dentro de empresas ou de comunidades. É sempre com muito entusiasmo que percebemos como profissionais ou comunidades respondem ao convite para o protagonismo. Como aparecem novas idéias! Como se produz o compromisso, o entusiasmo! Temos uma jornada para um futuro onde podemos enfrentar as barbaridades que criamos: fome, destruição do meio ambiente, a corrida para o lucro, para resultados não qualificados, para um planeta devastado, para toda tristeza, que podemos perceber, naqueles breves segundos em que deixamos nossa consciência falar.

Chega, precisamos de menos discursos e mais soluções para construir uma economia verde e inclusiva.

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