quinta-feira, 2 de outubro de 2014


                                                                        O toco

                                                     (da série contos do trabalho)

Lembrei do toco. Conheci o homem do toco, ao mesmo tempo, que conheci Eduardo Campos. Nem podia imaginar que ele explodiria anos depois.  Lembro de vê-lo chegando ao evento que conversava sobre os desafios de SUAPE, de mãos dados com sua esposa. Lembro de ter comentado com meu cliente da Petrobras, mais precisamente da Refinaria Abreu e Lima, que era estranho ver um político chegar sorridente de mãos dadas com sua esposa. Fui apresentada a ele e a Renata, aquelas apresentações formais que marcam mais quem conhece do que quem é conhecido. Algo me impactou. Era só o começo. No evento ele falou, é claro. Era um momento importante do seu primeiro governo em Pernambuco. A Refinaria, mágica, chegava como proposta a Pernambuco, uma promessa antiga de um cônego que declarou que, se ela chegasse Pernambuco, tudo mudaria ali e no nordeste inteiro.  Intenso período na história onde Lula, um pernambucano abraçava sua terra. Escutei seu discurso e numa premunição disse ao meu cliente: - Ele será candidato à Presidente da República, não sei se em 2014 ou 2018! Não sei explicar por que, mas ali senti que estava frente a um olhar que tinha futuro. Um olhar verde, ou azul em Pernambuco, terra que produziu muitas histórias nesse país.  A história escreveu a história de nova maneira e hoje temos Marina candidata e a refinaria enumerando corrupção e agressão ao meio ambiente. Espantosamente ainda não funcionando!

Mas, eu acabava de mergulhar mais uma vez naquela bandeira, que carrega um arco-íris. Pernambuco. Foram anos de convivência com um povo extraordinário. Um impacto. Não sabia que no dia seguinte ia conhecer o homem “do toco” na praia. Um desconhecido, com nenhuma “celebridade”, mas inesquecível para mim.

Na sobra de alguns instantes daquela louca jornada de entrevistas com ONGs, comunidades, colaboradores e líderes de várias instituições, naquele importante momento de Pernambuco, eu consegui chegar à areia para sentir o movimento do senhor líquido da terra: o mar. E eu ali me fascinava como carioca (será que paulista?) na descoberta desse território. Naquelas águas misturavam-se as experiências do dia, os clientes, os amigos, um fan club, que tinham inventado para mim. As ONGs conhecidas e admiradas, meus amigos! Mas sobrou um tempo!  Pouco tempo. Bastou atravessar a rua e lá estava eu naquele mar de tubarões, que me enganava na sua fantástica beleza e águas quentes! Tubarões de Suape, agora eu sabia. Erros e erros antigos, que fizeram mal aos mares da beira mar.

Sentei e lá fiquei com meu olhar perdido no mar! Adoro! De repente ouvi uma voz ao meu lado que chegou a me assustar: A senhora quer um pau’ água? Olhei curiosa o “pau” que ele carregada numa das mãos. Outros pareciam guardados num saco plástico. Eu lá sabia o que era um pau d’ água? Pois é. Ele me explicou. “Olha eu sustentei todos os meus filhos vendendo esses paus d’águas, a senhora pode levar, eles vão nascer. Pode confiar! A senhora ponha na água e terá uma linda planta para toda sua vida’. Eu olhei para sua cara, marcada pelo sol, pelas caminhadas na praia, para o pedaço de toco na sua mão... Pensei na minha imensa ingenuidade em crer... Sorri, pedi que me contasse mais. Ele sentou do meu lado na areia e menos de cinco minutos depois eu já era proprietária de um toco! Cinco reais! Um toco! Volto para o Rio com o toco, com um pau d’água afinal, esses tocos só podiam ser mágicos já que permitiram àquele homem alimentar todos seus filhos! Cinco reais! Cheguei a minha casa e segui as instruções daquele homem, de cara marcada por rugas fundas de sol. Era simples, “água num vaso cobrindo um terço do toco, e aguarde!”

E lá ficou o toco. Todos querendo jogar fora o toco, por que nada acontecia... Um pau, um toco na água. Meses a fio! “D. Nádia posso jogar isso fora?” Não, gritava eu! Vai nascer! E elas, minhas ajudantes, olhavam para mim com a condescendência do amor. Coitada dessa moça que fica aí, com um toco na água, acreditando, em quê mesmo? Eu simplesmente não podia deixar de acreditar naquele homem marcado, naquele pernambucano que tinha me descoberto, naquele governador estranho que andava de mão dada com a mulher, de olhos claros no cenário escravocrata do sertão, naquelas comidas especiais, naquelas pontes, naquela Olinda que tinha aprendido a descobrir e amar depois de tantas viagens para lá! Naquele Suape, nos municípios que seriam tão impactados pelo tal do progresso que a Petrobras, imagine, com a Venezuela, estariam levando para a região. Não. Eu acreditava menos na Abreu e Lima, com a Venezuela, do que no homem do toco.

Continuei a colocar água no vaso de vidro, mesmo que nada acontecesse por mais de um ano! Não estava errada. O toco começou a produzir raízes. Deu folhas. Eduardo Campos chegou a ser candidato em 2014. A Refinaria Abreu e Lima, não vingou com os venezuelanos. Patina em tristes histórias. O impacto está lá para quem tem olhos para ver. Mas uma linda história chegou para mim: o toco. Está comigo até hoje, e claro não é mais toco, só raízes que descansam na água e uma folhagem que ficou como a lembrança daquele homem que cumpriu sua promessa.

 Contei essa história por que o homem do toco, talvez continue ali pelas praias da beira mar e você possa cruzar com ele, e eu te digo, tenha fé, o toco brota, olhe a foto! Ele está aqui comigo até hoje! Podemos pensar que outros tocos brotarão. Como o toco que floresceu quando pode, quando quis. Talvez o toco possa florescer de outra forma, na mão de quem sabe bem fazer florescer, ainda agora em 2014. A mão do destino faz tocos florescerem, basta ter fé no toco. Deixo o resto do toco para você!
 

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