Frutos da semeadura
Simbólico um livro sobre a Ação da Cidadania,
que completa 20 anos, quando o Brasil discute sua democracia. Betinho falava da
cidadania como ondas do mar, quando ausentes estão ganhando força e energia,
para se transformar em novas ondas. Essa é a história contatada no livro desses
20 anos de luta pela conquista de direitos, que começou pelo essencial: direito
à alimentação. O livro começa em 1964. Fala da volta de Betinho ao Brasil, da Constituinte,
das Diretas Já, do lançamento da Ação da Cidadania no governo Itamar Franco,
que pela primeira e única vez ofereceu o horário exclusivo do governo
brasileiro na TV para que Betinho e Dom Mauro Morelli lançassem o movimento em
Rede Nacional.
O movimento despertou milhares de
voluntários que se organizaram em comitês. A pergunta era: qual é seu comitê? Eu
coordenei o comitê de publicitários e no livro estão os anúncios, os filmes
criados e produzidos, de forma voluntária e veiculados pela TV Globo e demais
emissoras, editoras. Mais de 30 spots foram ao ar durante os seis anos. O livro
fala da nova liderança de Maurício de Andrade, após a morte de Betinho em 1997,
do foco do trabalho: o Natal sem Fome. Os resultados estão no número de
voluntários que atuam em todo o Brasil, no trabalho de ONGs, muitas que
nasceram naquele período, na política pública que praticamente venceu a fome no
Brasil. O livro
mostra imagens desses cidadãos, numa direção de arte primorosa de Jair de
Souza.
No lançamento da campanha, em 1993,
Betinho disse: “Essa é uma campanha que
quer sim mudar o rumo do Brasil. Não o Brasil para uma minoria, mas para
todos!” Nem ele, nem Maurício Andrade teriam dificuldades para entender os
jovens ou a tecnologia, redes de convivência e articulação. Betinho voltou do exílio
com Carlos Afonso lançou o Alternex, o primeiro provedor à Internet do Brasil.
Betinho costumava dizer “que governo só
anda quando empurrado”. Seu partido eram os cidadãos livres, fazendo “sua
parte”. Acreditava na capacidade autônoma dos indivíduos, na força maior que
coloca jovens, como ele foi um dia, a serviço de criar um mundo melhor.
Hoje a equipe da Ação da Cidadania atua
nacionalmente a partir de um armazém que carrega a história do Rio de Janeiro.
Mais de 200 comitês ativos. A necessidade de apontar para o futuro, curiosamente coloca
juntos Daniel de Souza, filho de Betinho e Rodrigo Afonso, o Kiko, filho de
Carlos Afonso, um dos fundadores do Ibase junto com Betinho e Marcos Arruda.
Estão construindo com empresas parceiras programas de inclusão digital, buscando diminuir o
fosso que divide os mais ricos dos mais pobres. A rede de solidariedade focará
agora na exclusão de direitos, a desigualdade social.
A Ação
da Cidadania foi uma experiência da
democracia, uma expressão da diversidade da
sociedade, trouxe cidadãos e cidadãs para a
arena política, com voz, poder
e participação. Inspiradora, trouxe mudanças
fundamentais para pessoas, para o governo e
para as empresas, que foram convidadas pela primeira vez a agir.
Introduziu a solidariedade estimulando
conquista de direitos. Inovadora, despertou
o engajamento da cultura e dos profissionais de comunicação.
Na Ação da Cidadania
todos viram mestres. Não há
autoridade, há um chamado, uma convocação para a ação. Lendo o
depoimento dos participantes dos comitês, fica claro que o
convite de Betinho foi para uma ação coletiva, apaixonada, volátil e
viva, que educa e
desenvolve a autoestima.
“...
Ação da Cidadania, criando comitês, comitês
autônomos,
independentes, suprapartidários, criativos, concretos. Que sejam capazes de
identificar os problemas, propor soluções e serem capazes de trabalhar sem
esperar nada, sem esperar ordens, sem esperar verticalismo, burocracia,
centralização. (...), se o Brasil for capaz de criar milhares desses comitês em
todas as cidades, o Brasil vai mudar de rumo. O Brasil vai ser outro.”
(Betinho)
Foi uma
nova forma de criar lideranças, mudar modelos
mentais, abandonar velhos preconceitos. Educar
para a cidadania é educar para consciência, que nos habilite a
enfrentar os desafios econômicos, ambientais e
sociais. Betinho, o animador da Ação da Cidadania, está entre nós,
quando escolhemos empurrar o mundo na direção de mais direitos e menos
injustiças.
Quem sabe essa história, agora
registrada em livro, não é mais um voar do beija flor que conquistará
aprendizes na semeadura de mais e mais cidadania?
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