terça-feira, 19 de outubro de 2010

Portadores de Vozes


Escrever sobre os “porta-vozes” está na minha cabeça certamente há mais de um mês. Ouvi essa expressão de uma consultora que é minha companheira de caminho nos últimos anos­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­, Maria Aparecida de Paula. Ela é Professora da PUC de Minas Gerais, além de consultora. Desde que nos conhecemos, nos perdemos em trabalhos comuns. Cida, como todas nós que a chamamos, é mulher pequena, sempre montada no salto alto que percorre os aeroportos de todo o Brasil. De norte a sul, muitas empresas conhecem sua dedicação, sua capacidade de estruturar e focar em cada trabalho de comunicação que realiza. É uma fera, doce fera, em planejamento de comunicação.

Num trabalho conjunto, de repente escuto Cida falar:

“Nós comunicadores de fato, somos porta- vozes”.

Uma única frase perdida no meio de um dia de intenso trabalho sobre como planejar envolve escolhas, a visão estratégica para chegar lá, onde queremos chegar. Eu, que sou boa ouvinte, percebi o que ela queria dizer e em sucessivas sinapses, entendi tudo o que estava contido na expressão.

Cida não é uma mulher que só lê ou escreve sobre comunicação. Ela adora Guimarães Rosa! Por isso não é tão simples tê-la como consultora. Ela é daquelas professoras mais que consultoras, que trás literatura, a poesia, a magia das palavras para a vida de todos nós que trabalhamos com comunicação. E foi assim que os “porta-vozes” entraram na minha mente e eu pude consolidar a ideia de que, nós comunicadores, temos o difícil desafio de sermos observadores. Não podemos nos misturar aos colaboradores da organização. Precisamos olhar de fora, manter o nosso sentimento linkado “neles”, nos vários grupos nos quais uma empresa se divide. Sentir e entender o sentimento do empregado administrativo (dos quais fazemos parte), dos técnicos, dos operários e do operário de turno. Da liderança, cujo papel estratégico na comunicação, cada vez fica mais evidente.

O público interno não é igual. Não são iguais a condição de vida, a gratificação, a percepção. É diferente a expectativa, a forma de pensar, se emocionar. Aí entra a nossa capacidade de sermos “portadores de vozes”. Percebem o desafio? Não sentir por você, não pensar só por você, ou sua área. Não julgar. Perceber por todos e todas, sermos capazes de ouvir, de olhar, de enxergar a organização. Só assim o planejamento, as escolhas estratégicas poderão realmente alcançar eficiência.

Como é difícil ser um educador organizacional! Como cada um de nós tem que estudar, trabalhar a si mesmo, na busca do amadurecimento pessoal! Quantos Guimarães Rosa, entre muitas outras leituras e reflexões, são necessários para formar bons comunicadores!

Talvez seja fundamental averiguar seu desejo ou aptidão para se tornar “portador de vozes” na hora de escolher a profissão.

Cida é uma “portadora de vozes” de todos nós comunicadores. Precisamos trabalhar intensamente nossa capacidade de sair do eu, do egocentrismo, para cumprir nossa missão. O ator vive vários personagens e com isso reflete sobre sua condição de ser. Será que nós planejadores de uma comunicação realmente estratégica e voltada para a educação e o desenvolvimento humano não temos também desafios parecidos?

Os quatro quadrantes de Ken Wilber talvez ofereçam uma bússola para nosso aperfeiçoamento profissional. Não dá para OUVIR outros quando não encontramos tempo nem para ouvir a nós mesmos. David Bohm, um físico que se dedicou a refletir sobre a importância da comunicação, nos pede para nos dedicarmos a aprender a “colher com os ouvidos e colher com os olhos” para poder realmente construir uma comunicação transformadora. Consciente.

Percebo que quanto mais a tecnologia avança na comunicação, mais o desafio é conquistar a comunicação face a face. Não é esse o desafio da sua empresa? Ou na pesquisa de clima o feedback é bem avaliado? Ou você não percebeu que na área de comunicação temos o grande desafio de conquistar a liderança para a importância da comunicação, para que a empresa viva sua identidade a comunicação flua e o resultado seja a eficiência e a felicidade profissional?

Que surpresa para os “operacionais” da comunicação. Para aqueles que ainda pensam em ações engessadas, ou acreditam que é possível “vender” a organização para colaboradores num mundo de comunicação instantânea. Uma eficiente comunicação interna e com os stakeholders vizinhos, precisa muito mais do que veículos, campanhas, banners, jornal mural ou blogs e Twitter!

Precisamos conquistar a capacidade de nos ouvir, de ouvir e conquistar a mente e o coração das lideranças, ouvir de fato nossos públicos de relacionamento, sentir e entender que a comunicação é missão de todos e que acontece numa espiral dinâmica, sempre em movimento. Somos orquestradores, maestros. Assim nosso trabalho ganha a dimensão da educação.

Estamos num novo tempo. Somos “portadores de vozes” e elas nos dizem que precisamos urgente construir novos ambientes empresariais. Obrigada, Cida!, “Portadora de vozes” dos novos tempos.


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